27.11.06

As flores (neste caso, os girassóis) são o melhor do mundo



“O melhor do mundo são as crianças”. A frase foi imortalizada por Fernando Pessoa. No entanto, esta poderia ser bem diferente, se Pessoa tivesse conhecido a Floribela. Nos tempos que correm, o melhor do mundo são as flores. Elas estão por todo o lado. Ninguém escapa a esta febre ‘Floribela’, para a qual o antídoto ainda está longe de ser descoberto.

Não bastavam as saias, casacos, calças e camisolas… Acabo de encontrar numa estafante visita ao hipermercado*, que existe ainda o sortido Floribela e o chocolate Floribela. Sei que todos estão a pensar que também já existia o sortido e o chocolate Noddy, mas ele, ao menos, tinha um carro amarelo e ar de boneco.

Já a Floribela não passa de uma personagem de uma telenovela que vive à espera que o seu príncipe encantado se decida se quer viver feliz para sempre com ela ou não. Ou melhor é um simples upgrade para alguns da Cinderela, para outros, como eu da Branca de Neve e os Sete Anões. E ela, Branca de Neve a pobrezinha não teve direito a sortido e chocolate com marca própria. Levou um princípe e ficou toda feliz. Ao menos, esta conseguiu que ele se decidisse, por isso mais do que ninguém merecia ter direito a um chocolate Branca de Neve. Em vez disso, deram-lhe com farinha.

Confesso que não parei para observar as características do sortido e chocolate Floribela. Mas fiquei curiosa sobre qual o sabor do chocolate, pode até saber a flores... talvez na próxima (espero que seja longínqua) visita ao hipermercado possa admirar com maior atenção cada um dos produtos.
Desculpem insistir, mas só falta o Pai Natal vestir-se de Floribela...

* Por natureza, não me é fácil entrar num hipermercado para fazer compras. São milhares de produtos, todos quase iguais e só variam no preço. Os menos abastados são obrigados a perscrutar todos os preços à procura do mais barato e os mais abastados perdem tempo a avaliar as características de uns e outros, sérios crentes de que há diferenças. Mas o pior é entrar num hipermercado, em Dezembro, num fim-de-semana que, na compra de brinquedos é oferecido um desconto de 50 por cento em vales de compras. Um conselho: Não experimentem isto no hipermercado próximo de vocês.
NB. Um obrigada ao meu grande amigo pela fotografia de qualidade que me facultou

20.11.06

O Perfume



Já respiraste alguma vez, leitor,
Com gula, embriaguez, lento desejo,
Os ares de incenso que enchem uma igreja
Ou o esquecido almíscar de uma bolsa?

Profundo encanto, a ir-nos exaltando
Quando o presente restaura o passado!
Assim num adorado corpo o amante
Colhe a flor mais selecta da saudade.

Dos cabelos espessos, tão elásticos,
Turíbulo de alcova ou de bordel,
Subia um cheiro indómito e selvagem,

E dessas musselinas ou veludos,
Impregnados de pura juventude,
Ia alastrando um perfume de peles.


Baudelaire, in Flores do Mal


"Já respiraste alguma vez, leitor"
O cheiro do mar, de Vale dos Homens

15.11.06

A jurisprudência do provedor - Pr. I

De facto. Tal como foi anunciado, eu ando por aqui. Na verdade, não era bem por aqui que eu pretendia andar, mas como o blog do Pacheco Pereira já tem um provedor que, por acaso, é o autor que, por acaso, é o único leitor que, mesmo assim não tem pachorra para ler tudo até ao fim, optei por aceitar o convite de MM para dar alguma credibilidade cientifica a este espaço de egocentria gratuita.

Não esperem de mim elogios fáceis, nem mesmo elogios, ou até mesmo fáceis. Terei dois olhos desatentos à actualidade deste blog e limitar-me-ei a seguir o caminho de apreciação superficial dos conteúdos, na medida em que não tenho pachorra para estudar os dossiês.

Ainda assim, tenho a certeza que a mais ínfima das minhas sapientes análises trará mais ensinamentos para as três pessoas e um quarto que visitam este blog, que 36 posts do Pacheco Pereira (mais as 734.273.927 páginas e meia da biografia do Álvaro Cunhal), toda a literatura produzida pelos tribunais europeus no âmbito do processo de lenocínio de Belmonte e uma compilação de receitas do Doce da Casa, em fascículos, entregue com o 24horas ou o Expresso. Tudo junto!

Esta é a minha modesta declaração de princípios inicial e, como nem uma sandes de courato vou receber por isto, espero pelo menos fazer jurisprudência na maior parte das coisas que direi e provar que continua a não ser “justo nem razoável que persistam enviesamentos masculinocêntricos tão acentuados na selecção das questões políticas agendáveis” (Sampaio: 2004).

Se quiserem endereçar-me dúvidas ou apresentar sugestões, não o façam! Não vou ter tempo para ler! Se persistirem nessa hedionda intenção, façam-no para as caixas de comentários das minhas apreciações. Afinal, não vale a pena tirar o protagonismo à dona do blog, mais magnânime que o Pacheco Pereira e sensivelmente mais gira que a Odete Santos.

PS: Todas as vezes que a minha voz jurisprudente falar, comentarei o que bem me apetecer, destacando depois alguns comentários cuja escolha obedecerá ao critério, naturalmente, do que bem me apetecer.

PSD: “Boca no comentário” será o lugar para esse segundo momento.

CDU/PEV: Cá vão os primeiros “Boca no comentário”.

“BOCA NO COMENTÁRIO I”:
- Orientações de um blog com sucesso:
Todas as ambições culturais dos visitantes deste blog são muito bonitas e elevadas, mas, de facto, a malta poderá entusiasmar-se muito mais com a vida amorosa/erótico/sexual de MM. Até porque a coisa tinha começado bem, principalmente com a referência aos pilaretes fálicos da Covilhã. Recomendo à Gueixa que incentive mais este tipo de posts.

“BOCA NO COMENTÁRIO II”
- Os poetas de pacotilha:
Algures no mundo, Alex compôs uma lírica de inspiração erótico-burguesa, com especial incidência na apanha do míscaro (cujo nome científico é Tricholoma equestre, informação que vos deixo, sine pecunia) e dos pinocos. De facto, uma composição que rivaliza com alguns mestres do surrealismo nacional, autores de prosas como “Meu Lotus azul, ópio do povo, Jaguar perfumado tigre de papel” (GNR: 1992), ou ainda, “Há quanto tempo não comia um bifedestes, um bifedestes, à portuguesa. Ai que saudades qu’eu tinha d’um bifedestes, um bifedeeeeeeeestes à portuguesa” (Nel Monteiro: 1995). Continue o bom trabalho Alex, cá esperamos mais destas. Se conseguir incluir bifes acém nos seus delírios, ficam ainda mais suculentos.

Despeço-me com amizade,

Sancho de Interaccionista e Simbólico, Dr. Provedor
(Interaccionista simbólico, para os mais chegados, para os que sabem onde ele mora e onde estaciona o carro ou então que lhe conhecem os podres)


12.11.06

Ele anda por aí

A necessidade de regular um blog que se tem revelado demasiado selvático, destacando-se da blogosfera nacional, impõe que, a partir do dia 15 deste mês, o provedor Interaccionista Simbólico passe a analisar os piores posts e comentários deste blog.

Common People

Somos pessoas comuns.
Quero ser andróide.
Há uma tempestade lá fora.
Às vezes quando olho fundo nos teus olhos, eu juro que vejo a tua alma.
Faz-me impressão o trabalho que se tem em ser superficial.
O homem é um ser inominável.
Sou egocêntrica, juro que vejo o mundo a rodar à minha volta.
My name is Men, Car men.
Era de noite e levaram-me com ele.
Eu nunca esqueço num sobrenome.
A sujidade invade-me as entranhas.
Andando pelas ruas, perdi-me.
Não me lembro.
I just can't get enough.
Carrego ao ombro um lenço branco que levo à minha amada.
E companhia.
No problem.
Nunca me engano e, raramente, tenho dúvidas.
Não consigo parar.
O Pai Natal existe?
Vou acabar com ele.
Está-me a chover em casa.
Não estou bêbedo, mas há quem esteja.
How are you?
Visto-me de riscas para impressionar o desconhecido.
O que é a arte?
Um tecto repleto de cogumelos de humidade e um Pollock na parede.
We are just common people.
N.B. Rasgado elogio à primeira instalação artística colectiva que publico neste blog. Aos co-produtores, o meu bem haja.

9.11.06

Pai Natal e Menino Jesus trocam "prendinhas"

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez decretou que, em nenhum edifício público do país devem ser usadas decorações contendo imagens ou bonecos do Pai Natal, refere o Público, de 9 de Novembro. Declarado anti-americano, Chávez determinou que os símbolos da tradição natalícia americana fossem substituídos pelos presépios com o Menino Jesus nas palhinhas deitado e outros elementos que caracterizam a tradição natalícia da Venezuela. Uma decisão, que o chefe da nação justificou com a necessidade de "restaurar as tradições nativas".
O boicote ao Pai Natal poderia deixar muitas crianças tristes, mas enquanto proíbia o Pai Natal, o Governo de Chávez tratou de compensar os pequenos, oferecendo a cerca de um milhão de papás funcionários públicos e reformados o equivalente a três subsídios natalícios. Uma prenda que costuma cair no sapatinho apenas no último mês do ano, mas que para deleite de muitos foi antecipada e entregue, curiosamente, a poucos dias das presidenciais venezuelanas, marcadas para 3 de Dezembro.
Mas importa focar atenções na nobre intenção do presidente venezuelano de "restaurar as tradições nativas". A decisão avançada pelo diário venezuelano Últimas horas, citado pelo Público, poderá implicar o fim de uma carreira de sucesso do velhinho de barbas brancas vestido de vermelho pela Coca-Cola, não pela idade avançada que tem, mas porque se outros países seguirem o exemplo, em nome da preservação da identidade de cada nação, a figura bonacheirona do Pai Natal poderá ser extinta. Recorde-se que "num mundo cada vez mais globalizante, os países devem distinguir-se do todo, apostando no que lhes é intrínseco, no que constitui a sua cultura identitária”. Entendi que o melhor seria colocar esta afirmação entre aspas, porque já a ouvi imensas vezes, não posso citar os autores, porque quase todos, que se preocupam com a afirmação da cultura portuguesa, costumam citá-la.
Por outro lado, o embargo ao Pai Natal pode sair caro a Hugo Chávez. As próximas gerações poderão acusar o presidente da Venezuela de ter aberto um inusitado conflito natalício. A temática não é nova, mas ganha redobrada importância a poucos dias do Natal.

Decidido a pôr fim ao idoso senhor que apesar da barriga, agilmente, desce pelas chaminés de 24 para 25 de Dezembro, Chávez poderá ao mesmo tempo abrir as hostilidades entre o Pai Natal e o jovem Menino Jesus nas palhinhas deitado. O eventual conflito está já a ser antecipado por especialistas em conflitos natalícios, que avançam a iminência de uma invasão de Belém, pelo Pai Natal. Para já, o Menino Jesus poderá levar um avanço neste conflito a avaliar pela idade física. As melhores músicas são também as do Menino Jesus. Importa ainda referir que, enquanto o Pai Natal distribui presentes, o Menino Jesus tem ouro, que os três reis magos lhe ofereceram quando nasceu. Uma vantagem decisiva na hora de convencer os adultos e, por consequência, as crianças.
No entanto, há que contar com o exército de ajudantes do Pai Natal, os duendes que se dedicam a embrulhar presentes. Apesar da simpática tarefa destes ajudantes, é necessário não descurar que estes corajosos são também conhecidos como exímios atiradores de bolas e pinheiros de natal. Também o frio que se faz sentir em alguns países poderá ser uma vantagem para o Pai Natal que, naturalmente, tolera melhor as baixas temperaturas, enquanto o Menino Jesus para sobreviver ao frio teve de ser aquecido pelo bafo de uma vaca e um burro, uma vez que a única peça que o protegia era uma espécie de tanga. Ao lado do Pai Natal estará também a temida Mãe Natal, que, apesar de ser vulnerável, dada a sua dependência pelo incenso (há sempre um pauzinho a ser queimado no Pólo Norte), é reconhecidamente, uma óptima cozinheira e destaca-se na arte de atirar tachos.
Os especialistas dividem-se quanto à eventual duração do conflito. Reina também a dúvida quanto à existência de armas de destruição maciça. Correm rumores de que o Pai Natal terá contratado Donald Rumsfeld, agora no desemprego, para convencer as Nações Unidas pelo Natal (NUN)da existência das ditas cujas em Belém.
Alguns pedopsiquiatras estão preocupados com o impacto do conflito junto das crianças, sobretudo, as que se portaram bem durante o ano, já que se poderão sentir muito defraudadas. É que os presentes que o velhinho de barbas brancas costuma deixar em troca de um copo de leite e um prato de bolachas podem não aparecer na manhã de 25 de Dezembro. No entanto, este blogue apurou, que o Super-Homem já se ofereceu para conduzir as renas. Esta é uma boa notícia. Enquanto o Pai Natal e o Menino Jesus trocam... "prendinhas", os mais pequenos podem estar descansados que as prendas, ou melhor, o Natal está a salvo.

3.11.06

O tempo e as pessoas

"O Inverno do nosso descontentamento" é o título do texto de Pacheco Pereira, publicado no PÚBLICO, de 2 de Novembro. A roçar o genial, Pacheco Pereira descreve a relação entre o Inverno e os estados de alma das pessoas. O tema é, de facto, um dos meus preferidos. Por dois motivos: "a desculpa do tempo" e "a culpa é do tempo".
A desculpa do tempo
É das mais requisitadas. O ser humano é exímio na procura da chamada boa desculpa, para esconder o que realmente aconteceu. Se ficou a dormir mais do que devia: "Desculpe, mas perdi as horas". Se preferiu ler o jornal, enquanto tomava calmamente o pequeno-almoço e por isso demorou a chegar a uma reunião: "Desculpe o atraso, o tempo está terrível, demorei duas horas a chegar". Se o fornecedor demora a entregar uma encomenda, porque se esqueceu de a fazer: "Sabe, demora algum tempo a cá chegar". Se o padeiro se atrasou a meter o pão no forno porque estava a ver o programa da Fátima Lopes: "Falta pouco tempo para sair pão quentinho". Se o autocarro se atrasa: "Desculpe mas não tenho tempo para conduzir e tirar bilhetes".
E o mais estranho de tudo é que por mais recorrente que seja esta desculpa, todos parecem aceitá-la, até de bom agrado, sem que recriminem a pessoa por, simplesmente, se ter atrasado.
A culpa é do tempo
Este chavão agrada-me ainda mais do que a desculpa do tempo. No elevador, na rua, em casa ou no autocarro, a culpa é sempre do tempo. Serve para desbloquear conversas, mas não só. Basta estarmos atentos a uma conversa entre duas senhoras de idade, que se queixam dos problemas de saúde que as afectam, e, que não hesitam em culpar o tempo: "Hoje dói-me muito a coluna. Deve ser do tempo". As amigas que, fruto de infortúnios amorosos, ou dificuldades profissionais, atravessam momentos negros nas suas vidas também arranjam um bode expiatório: "A culpa é do tempo, andamos mais em baixo". Mas a minha preferida é o chamado queixume típico do português: "Não me apetece trabalhar". Ao lado há sempre alguém para lhe confortar a alma e eliminar à partida qualquer problema de consciência: "A culpa é do tempo".
Mais do que influenciar os estados de alma, o tempo será sempre o melhor bode expiatório do homem.

A "nave de pedra" de Fernando Namora

Numa das minhas viagens pelos blogs alheios, li algures alguém queixar-se do interior de Portugal, descrevendo esta faixa do país como o exílio a que são condenados os meninos que se portam mal. Durante anos, andei perdida por estas paragens. Não quero parecer saudosista ou mesmo lamechas. Mas ao ler o queixume desse amigo, lembrei-me das belezas e riquezas deste cantinho encostado à serra. Lembrei-me de como me sentia bem em Monsanto (concelho de Idanha-a-Nova, distrito de Castelo Branco). Recordo o que escrevi:

A “nave de pedra” de Fernando Namora

“Nave de pedra” chamou Fernando Namora a Monsanto. Os gigantes penedos de granito cravados na montanha que inspiraram o romancista parecem sussurrar uma história repleta de invasões e lendas. Estórias guardadas na memória das gentes da aldeia de Monsanto, moldada pelos socalcos e veredas edificadas por estas rochas.

Não é difícil perder o rumo por entre as ruas estreitas da aldeia mais portuguesa de Portugal, aliás, é aconselhável... ora pelas calçadas, ora pelos barrocais, nome que o povo dá aos pedregulhos graníticos que abundam em Monsanto e, que ao longo do tempo foram ganhando estranhas formas, que tentam a imaginação.
A cada esquina, são descobertos pequenos e simpáticos recantos. Os balcões floridos ladeiam as calçadas, ponteadas pelas típicas habitações que ilustram o engenho destas gentes raianas. Ardilosos, escavando a pedra ou aproveitando os blocos graníticos como paredes ou coberturas, os monsantinos foram construindo as pequenas casas que convivem com os solares dos mais abastados. A conservação destes espaços valeu a Monsanto a classificação de aldeia histórica de Portugal.Da estrada, avista-se o cabeço de Monsanto (ou de Monte Santo como já foi chamado) refúgio do médico e escritor, Fernando Namora, que se mudou para a aldeia em 1944 e onde escreveu o romance “Minas de San Francisco”.
O monte irrompe desta campina raiana do concelho de Idanha-a-Nova. O casario de granito, espraiado pela encosta escarpada, espalha-se desde o sopé até ao castelo medieval, construído no primeiro quartel do século XIII.

Da porta do Espírito Santo a paisagem é soberana. Mas é pelas calçadas que começa a viagem. Alguns metros acima, encontra a casa do médico e escritor, Fernando Namora. “Os meus últimos livros na sua montagem e redacção finais foram escritos na aldeia”, diz a lápide de homenagem. A cortina de granito conduz os passos em direcção à Igreja Matriz de S. Salvador, provavelmente, construída no século XV. Rumo ao castelo, pela rua do Marquês da Graciosa, impõem-se os solares da família Pinheiro, do século XVIII e o solar da Graciosa, onde está instalado o pólo museológico de gastronomia e o posto de turismo.

Antes do castelo, ainda há tempo para descer pela rua da Pousada, ver de perto o pelourinho, o antigo consultório de Fernando Namora e a torre do relógio, onde está a réplica do galo de prata, que simboliza a atribuição, em 1938, do título de “aldeia mais portuguesa de Portugal” a Monsanto. De volta à romagem até ao castelo, fica pelo caminho a gruta. Mais acima, o forno comunitário esconde um miradouro natural, e uma casa que exemplifica o engenho destas gentes. É tempo para uma primeira paragem... é tempo de repousar o olhar na campina raiana.
Ao longo das calçadas, as mulheres sentadas vão exibindo as marafonas. São pequenas bonecas de trapos feitas a partir de uma cruz. Dizem que simbolizam a deusa Maia, da fecundidade. Não tem olhos para ver nem boca para falar. Devem ser deitadas na cama dos noivos na noite de núpcias para dar sorte, aconselham as artesãs. Também podem afastar as grandes trovoadas. Terra de usos e costumes, em Monsanto ecoam também os sons dos adufes.

O percurso é retomado. Já dentro da fortificação, pare, descanse e respire fundo. Aprecie o silêncio do interior do país. Depois de calcorrear o castelo, palco de outras guerras, é hora de descer, de reencontrar os monsantinos dispostos a partilhar as suas memórias.

Encarem esta longa dissertação, como uma boa sugestão para um passeio, neste fim-de-semana, que se anuncia marcado pela chuva...

2.11.06

O Natal já chegou

Nem eu sabia que tinha tanto para escrever. Depois de ter decidido seguir a máxima de quem é fixe tem um blog, saí à rua, como em tantos outros dias, mas talvez com olhar direccionado para os "mimos" com que somos surpreendidos todos os dias. Tomei café, como é habitual, depois do almoço. Sentei-me ao balcão porque estava com pressa. Passei os olhos pelo jornal e reparei em pequenos brilhantes que estavam espalhados pelo balcão. Faziam-me lembrar as fitas que se colocam nas árvores de natal. Fixei o olhar no tecto e fiz, rapidamente, umas contas de cabeça. Ainda falta um mês e 23 dias para o Natal. Não pode ser!

A surpresa não tardou. Quando volto as costas ao balcão, eis que ali estava ela, com luzinhas acender e apagar, vestida de fitas vermelhas: a árvore de Natal. Ainda aturdida saí e sosseguei-me a mim própria: O Natal é quando o homem quiser. Mas ainda assim, não queria acreditar que a um mês e 23 dias do Natal, aquele estabelecimento comercial já tivesse a sua pomposa árvore de Natal. Sei que há excêntricos ou aqueles que nem desmontam a árvore e ligam as luzes quando se aproximam da época natalícia, também as câmaras já estão a enfeitar as ruas com as devidas decorações, mas ter a árvore de Natal feita no dia 2 de Novembro, não quero ser purista, mas parece-me exagerado... A não ser que dê jeito ao negócio!

Já que estamos a falar de Natal, posso já dizer que quero receber uma caixa de bombocas, de morango, que são as minhas preferidas.

Ainda o tulicreme...

Hoje confirmaram-me que o sabor do tulicreme também já não é igual. "Tem uma espécie de grainhas", confirmou a minha fonte.

Pinocos - A atracção fatal!

A moda generalizou-se em quase todas as cidades do país, que lutam, desenfreadamente, contra os automobilistas que insistem em estacionar em lugares proibidos. Mas desenganem-se os que pensavam que iria fazer uma dissertação sobre esse desvio comportamental, alimentado pela ânsia de levar o carro para dentro de qualquer estabelecimento. Até porque esse é apenas um reflexo da sociedade acelerada em que vivemos. A culpa não é do indivíduo, mas sim do colectivo.

Prefiro voltar à cruzada encetada pela maioria das cidades, que impregnaram algumas ruas, devolvidas ao peão (que merece, embora esteja em vias de extinção) com uns já habituais objectos, que eu apelido de "pinocos". De certo que as ditas peças arquitectónicas têm um nome técnico, que me escapa. Os ditos "pinocos" são dos mais variados feitios e cores, agradando a gregos e a troianos, desagradando aos automobilistas que não podem continuar a seguir a velha regra: O fruto proibido é o mais apetecido. Para ser mais precisa não devem seguir a velha regra até porque um singelo pinoco daqueles pode causar alguns estragos em qualquer viatura. Mas ainda assim há os chamados indíviduos, injustamente, rotulados como chicos espertos (não se esqueçam que eles são fruto do colectivo) que estacionam e para surpresa de todos conseguem tirar o carro sem qualquer amolgadela. No entanto, fica para trás um "pinoco" destroçado, despojado do lugar altivo que tinha conquistado, e que só por curiosidade, foi pago com dinheiro de todos. Pequenos pormenores, até porque a culpa não é do indivíduo, nem da sociedade, a culpa é de quem escolheu o feitio do "pinoco", que mais tarde, ou mais cedo será reposto, à custa do nosso dinheiro mais uma vez.

Se optarem por um pinoco de estilo fálico, como os que existem na rua Direita, na Covilhã, ou mesmo os antigos pinocos da rua D. Duarte, em Viseu, ou os que existem junto à Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Viseu é óbvio que estão a desafiar os automobilistas. Os senhores automobilistas, vítimas da sociedade, encaram as peças de arte como um autêntico jogo de bowling. Ganha quem mais pinocos derrubar. E diga-se, a bem da verdade, que o gosto pelo jogo ainda não é prioibido em Portugal.

No entanto, há más notícias. Os automobilistas que insistirem em estacionar na rua D. Duarte, em Viseu, poderão enfrentar novas dificuldades. É que os pinocos de estilo fálico foram substituídos por uns "polidos" e - para que todos possam ver a imagem correcta - capacetes dourados, implantados com uma curta distância entre eles. Pelo menos acaba-se a semelhança com o bowling. Estão a salvo os "pinocos", enquanto não se descobrir um outro jogo qualquer. É que, normalmente, os automobilistas portugueses têm muita imaginação, basta avaliar as acrobacias que costumam fazer na estrada.

1.11.06

O tulicreme e os gelados de gelo

Foi um amigo que me atirou para as recordações da minha meninice, quando um destes dias resolveu lembrar-se de um dos produtos que fez as delícias de uma geração inteira: o tulicreme. Havia, pelo menos, de chocolate ou de avelã, mas eu preferia, de longe, o de chocolate. Nem sequer esperava pelo pão e preferia comer directamente da caixa.

Ao falar do tulicreme, que não tinha versão light, vieram à conversa histórias de vida. Uma pessoa querida conta, recorrentemente que, na sua casa, os pais compravam uma caixa de tulicreme para cada filho. A caixa tinha de durar o máximo de tempo possível, só quando todos terminassem as suas respectivas caixas é que os pais compravam mais. Mas o que acontecia quase sempre era que se criava uma espécie de concorrência cruel. A irmã mais nova, fruto da gulosice, terminava sempre primeiro a caixa que lhe tinha sido atribuída, ficando depois durante dias a babar-se, esperando que os irmãos devorassem as suas embalagens, pois só assim haveria mais tulicreme.

A marca é indiferente, mas os sabores ficam. Ao falar no tulicreme quase todos se lembram do sabor que tinha, de como o comiam ou devoravam. O mesmo acontece com aqueles chocolates embrulhados em papel brilhante, que tinham uns carros ou umas bolas impressas. Ou mesmo as bombocas, com que todos os anos, no Natal, a minha avó Malhinda me presenteava. E ainda os gelados de gelo de laranja ou morango que custavam poucos tostões.

As lembranças de cada um são feitas destas pequenas delícias, que à distância de alguns anos continuam a ser familiares. Falta saber se os sabores de agora vão permanecer nas lembranças futuras? É que pelo menos o sabor das bombocas já não é o que era.

Aguardo mais histórias do tulicreme.

No rules

Porque é que tem de ser preto no branco?