3.11.06

O tempo e as pessoas

"O Inverno do nosso descontentamento" é o título do texto de Pacheco Pereira, publicado no PÚBLICO, de 2 de Novembro. A roçar o genial, Pacheco Pereira descreve a relação entre o Inverno e os estados de alma das pessoas. O tema é, de facto, um dos meus preferidos. Por dois motivos: "a desculpa do tempo" e "a culpa é do tempo".
A desculpa do tempo
É das mais requisitadas. O ser humano é exímio na procura da chamada boa desculpa, para esconder o que realmente aconteceu. Se ficou a dormir mais do que devia: "Desculpe, mas perdi as horas". Se preferiu ler o jornal, enquanto tomava calmamente o pequeno-almoço e por isso demorou a chegar a uma reunião: "Desculpe o atraso, o tempo está terrível, demorei duas horas a chegar". Se o fornecedor demora a entregar uma encomenda, porque se esqueceu de a fazer: "Sabe, demora algum tempo a cá chegar". Se o padeiro se atrasou a meter o pão no forno porque estava a ver o programa da Fátima Lopes: "Falta pouco tempo para sair pão quentinho". Se o autocarro se atrasa: "Desculpe mas não tenho tempo para conduzir e tirar bilhetes".
E o mais estranho de tudo é que por mais recorrente que seja esta desculpa, todos parecem aceitá-la, até de bom agrado, sem que recriminem a pessoa por, simplesmente, se ter atrasado.
A culpa é do tempo
Este chavão agrada-me ainda mais do que a desculpa do tempo. No elevador, na rua, em casa ou no autocarro, a culpa é sempre do tempo. Serve para desbloquear conversas, mas não só. Basta estarmos atentos a uma conversa entre duas senhoras de idade, que se queixam dos problemas de saúde que as afectam, e, que não hesitam em culpar o tempo: "Hoje dói-me muito a coluna. Deve ser do tempo". As amigas que, fruto de infortúnios amorosos, ou dificuldades profissionais, atravessam momentos negros nas suas vidas também arranjam um bode expiatório: "A culpa é do tempo, andamos mais em baixo". Mas a minha preferida é o chamado queixume típico do português: "Não me apetece trabalhar". Ao lado há sempre alguém para lhe confortar a alma e eliminar à partida qualquer problema de consciência: "A culpa é do tempo".
Mais do que influenciar os estados de alma, o tempo será sempre o melhor bode expiatório do homem.

6 comentários:

Anónimo disse...

pois, pois... é essa a desculpa que me costumas dar né?

MMiranda disse...

Caro Oh mar salgado:

Os meus posts são sempre escritos a partir da minha experiência pessoal.

Raimundo disse...

Em primeiro lugar, o melhor bode expiatório do homem são as gaijas. E até te explicava porquê, mas para além desta página estou a ver um vídeo da Merche semi-nua e não posso fazer as duas coisas em simultâneo. E um gaijo tem prioridades.

Anónimo disse...

Socorrendo-me de António Gedeão - e por hoje já tive tempo de voltar ao teu blog -, aqui vai mais uma achega sobre o tema:

Tempo de Poesia

Todo o tempo é de poesia
Desde a névoa da manhã
à névoa do outro dia.
Desde a quentura do ventre
à frigidez da agonia
Todo o tempo é de poesia
Entre bombas que deflagram.
Corolas que se desdobram.
Corpos que em sangue soçobram.
Vidas que a amar se consagram.
Sob a cúpula sombria
das mãos que pedem vingança.
Sob o arco da aliança
da celeste alegoria.
Todo o tempo é de poesia.
Desde a arrumação ao caos
à confusão da harmonia.

Anónimo disse...

Isto é um comentário. Este é o meu primeiro comentário neste blog de uma pessoa que eu tenho o sentimento de ____________ (preencher mais tarde) conhecer há muitos anos. E por isso queria aqui marcar a minha posição, em especial pelo facto de ser a primeira vez que comento um post deste blog ainda que não seja a primeira vez que o visite. Sim, porque a primeira vez que o fazemos concentra sempre um simbolismo de grande carga emocional. Daí que este meu comentário e, como entroito, mereça desde já, esta ressalva.

Comentário:
Agora não tenho tempo. vou almoçar.

Anónimo disse...

Esta "blogger" anda com muita falta de tempo...quando uma pessoa se começava a entusiasmar com as suas reflexões, desaparece!!!